sábado, 8 de maio de 2010

A EDUCAÇÃO FISICA NO ENSINO MÉDIO: PRÁTICA ESPORTIVIZANTE?

Pensar a Educação Física é, certamente, refletir sobre as formas sistematizadas de cuidado com o corpo, que tiveram como locus privilegiado o espaço escolar. Desde o século XIX direcionaram-se políticas com o objetivo de tornar o corpo mais saudável, foi o chamado movimento higienista. Somado a isto, estava a intenção de forjar uma raça “melhorada”, o que se denominou de eugenismo. Foi a escola um dos principais agentes propagadores destas ações, principalmente a partir do advento dos Grupos Escolares.
No início do século XX, os discursos higienistas e eugenistas ainda eram muito fortes e, alicerçada neste pensamento a ginástica (Educação Física) consolidou-se como um elemento importante na formação escolarizada. Durante toda a República Velha, a ginástica se fez presente no âmbito escolar através da aplicação de diferentes métodos: sueco, francês, alemão, dentre outros. Contudo, a partir da década de 30 do século passado, o esporte começou a estabelecer-se como um conteúdo da Educação Física. Foi nesta mesma época, de nacionalismo exacerbado, que o Presidente Getúlio Vargas “elevou”[1] a Capoeira ao posto de “ginástica nacional”.
A partir deste momento, o entrelaçamento entre a Educação Física e o Esporte vai se tornando cada vez mais forte. Apesar de entender que esta junção variou muito a depender da região e do estado, é comum encontrarem-se fotos de equipes esportivas em diferentes arquivos escolares espalhados pelo país.
Pode-se afirmar, entretanto, que a partir da segunda Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a 5692/71 e, principalmente, com o Decreto 69450/71, consolidou-se uma verdadeira simbiose entre a Educação Física e o Esporte. Com o referido Decreto, o projeto político-pedagógico para a Educação Física no Ensino Médio[2] enfatizava o Esporte de competição como conteúdo hegemônico da Educação Física. Desta forma, no Ensino Fundamental priorizou-se a recreação, os jogos pré-esportivos, a iniciação esportiva e, no Ensino Médio, a formação de equipes e o treinamento esportivo.
Esta política voltada para a Educação Física, principalmente no Ensino Médio, estava calcada no sucesso alcançado pelos Jogos Escolares Brasileiros (JEB’s) e os Jogos Universitários Brasileiros (JUB’s). A esportivização da Educação Física foi tão flagrante nesta época que a prática esportiva via Educação Física foi inserida no meio universitário através da obrigatoriedade da prática desta disciplina em todos os cursos de nível superior.
A partir da década de 70, com a massificação das coberturas esportivas e a ampliação do seu mercado em termos comerciais, esta prática social ganhou dimensões que ultrapassaram o de prática desinteressada, de lazer, abarcando contornos gigantescos, consolidando-se como uma instituição social.
A escola passou a ser vista como um “seleiro” de novos atletas, o local adequado para a formação de um “país olímpico”. Com isto, a Educação Física passou a ficar cada vez mais refém da prática esportiva. Profissionais e intelectuais preocupados com a dimensão que o esporte tomava no espaço escolar passaram a desferir severas críticas a este encaminhamento. Alguns asseveravam, utilizando-se do pensamento marxiano, que o esporte era o “novo ópio do povo”, pois ele levava a população ao estado de alienação.
No início da década de 90, vários foram os profissionais da Educação Física que escreveram sobre o assunto, a exemplo de Mauro Betti (1995) e Valter Bracht (1992). Este último dizia que a criança ao praticar esportes aprendia a respeitar as regras do jogo capitalista[3]. Ainda nesta década a aprovação da LDB 9394/96 e a inserção da Educação Física como um componente curricular integrado à proposta pedagógica da escola trouxeram novas perspectivas de atuação.
A década de 90 viu pulular, ainda, novas concepções para a Educação Física: crítico-superadora, a partir da escrita do livro Metodologia do Ensino da Educação Física (1992) tendo como elaboradores Valter Bracht, Micheli Ortega, Celi Tafarel, Carmem Lúcia Soares, Elizabeth Varjal e Lino Castelani Filho; a desenvolvimentista, tendo por principal articulador Go Tani; a crítico-emancipatória de Elenor Khunz; a de aulas abertas de Heiner Hildebrandt; a da aptidão física com Dartagnan Pinto Guedes, dentre outras.
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[1] Digo elevou, pois a Capoeira até então era uma prática marginalizada, inclusive considerada a sua prática contravenção pela legislação vigente.
[2] Utilizarei aqui as nomenclaturas dadas pela LDB 9394/96, ou seja, ao invés de Ensino de 1º e 2º Graus, respectivamente, Ensino Fundamental e Médio.
[3] Esta posição foi revista pelo autor em artigos e trabalhos posteriores.

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