terça-feira, 15 de junho de 2010

A EDUCAÇÃO FISICA NO ENSINO MÉDIO: PRÁTICA ESPORTIVIZANTE? (FINAL)

Além desta competição patrocinada pelo Governo do Estado, Sergipe conta, ainda, com mais duas em nível escolar. Uma delas patrocinada e organizada por uma das afiliadas da Rede Globo de Televisão, a TV Sergipe, chamada de “Olimpíadas Escolares” e a outra que congrega somente as escolas particulares, denominada de Jogos das Escolas Particulares de Sergipe (JEPS).
Estas competições cobrem quase que o ano inteiro gerando empregos para muitos professores de Educação Física, que são contratados como técnicos esportivos e, como tal, avaliados por seus sucessos e insucessos.
Tais competições, como já dito, servem como vitrines para as escolas particulares, inclusive gerando “chamadas televisivas” para divulgar os resultados alcançados. Recentemente, o Colégio Amadeus divulgou o resultado de campeão geral nas “Olimpíadas Escolares” realizada pela TV Sergipe, cunhando a seguinte frase ao final da propaganda: “Campeão no Vestibular e no Esporte”. A colocação da conquista esportiva ao lado dos resultados obtidos no vestibular denota o status desta prática no âmbito escolar.
Para conseguir um bom desempenho nas competições, algumas instituições de ensino particular mantêm estruturas físicas e turmas de treinamento. Um exemplo disto é o Colégio Arquidiocesano Sagrado Coração de Jesus, que conta com profissionais específicos para cada modalidade esportiva e um espaço de treinamento, contando com ginásio e parque aquático. Além deste, outros estabelecimentos, a exemplo do COC/São Paulo e o Amadeus, dispõem de estrutura semelhante.
Como se pode perceber, principalmente nas escolas particulares, é muito difícil superar o modelo esportivizante nas aulas de Educação Física, com um agravante, algumas destas escolas cobram pelas práticas de iniciação esportiva e aqueles que não se “matriculam” em tais atividades devem fazer às aulas de Educação Física, uma espécie de “punição” por não praticarem esportes. Desta forma, em algumas instituições particulares o Esporte ganhou autonomia, não precisando mais da Educação Física para existir e esta, por sua vez, perde sua forma de se legitimar no âmbito escolar.
Contudo, é importante ressaltar que na rede pública de ensino são muitas as possibilidades de ação, no entanto a tarefa não é tão simples, pois o esporte está consolidado socialmente, tem sua legitimidade, enquanto a Educação Física no Ensino Médio encontra-se à deriva, pois não se encaixa no modelo pré-vestibular dado a este segmento da educação básica e, não consegue demonstrar sua importância na formação do jovem, por isso se torna “mais fácil” atrair os adolescentes pelo seu gosto esportivo e, desta forma, mantem-se como um componente secundário na formação escolar.
É preciso expandir os horizontes dos conteúdos da Educação Física para além do esporte e da promoção da saúde, contribuindo assim, para que o corpo possa ser observado em suas dimensões histórica, sociológica, biológica, antropológica, filosófica; fazendo com que o aluno perceba o corpo individual e coletivizado e, com isso, a Educação Física dará um passo significativo para sua legitimação sem a necessidade de se ancorar em práticas sociais, a exemplo do esporte.

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO e FONTES

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BRANDL, Carmem Elisa Henn. A nova política para o ensino médio: um estudo da Educação Física a partir das novas diretrizes e dos novos projetos pedagógicos. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v.24, n.3, p. 71-86, 2003.
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KUNZ, E. Transformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí: UNIJUÍ, 1994.
LEITE FILHO, Gilson Dória et alli. Subsídios aos conteúdos da educação física. Aracaju: SEED, 1998.
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SANTIN, Silvino. Educação Física: da alegria do lúdico à opressão do rendimento. Porto Alegre: Edições EST / ESEF, 1996.
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TANI, Go et al. Educação Física Escolar: fundamentos de uma abordagem desenvolvimentista. São Paulo: EPU, 1988.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

A EDUCAÇÃO FISICA NO ENSINO MÉDIO: PRÁTICA ESPORTIVIZANTE? (CONTINUAÇÃO IV)

No ano seguinte, em 1999, por meio do Decreto nº 1251/99, a mesma Secretaria normatizava o ensino da Educação Física, buscando, segundo o documento, “a valorização tanto da disciplina como do educando”. Neste sentido, no seu Artigo 3º, asseverava: “os conteúdos curriculares da educação básica deverão observar ainda, a promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não formais”. Com isto a SEED, deixava claro o seu entendimento sobre a Educação Física e à que ela deveria se destinar. Este Decreto, ao que parece, regulamentava a esportivização da Educação Física em âmbito estadual, pois no Parágrafo Único do Artigo 3º ressalta que o professor poderá dispor de 50% de sua carga horária para o desenvolvimento de atividades e projetos da área, sendo um deles e, talvez o principal, o treinamento desportivo.
Ainda em 1999, a SEED promoveu o I Encontro Estadual de Educação Física, incluindo a apresentação de trabalhos de professores e acadêmicos da área. Uma atividade semelhante, como já dito anteriormente, foi realizada pelo DEF/UFS, com a “Semana de Educação Física”. O evento promovido pela SEED, continua acontecendo anualmente, fato que não ocorre com o do DEF/UFS, o qual somente realizou três edições.
Estes encontros possibilitam uma formação continuada e uma troca de experiências que pode levar a um aperfeiçoamento na prática educativa dos professores de Educação Física, pois, no momento que são expostas as dificuldades e os sucessos, há um importante momento de construção coletiva do conhecimento.
No ano de 2006, a SEED, por meio de suas Diretorias Regionais de Educação (DRE’s), construiu o “Caderno de Subsídios Educação Física”. No que se refere ao Ensino Médio, nota-se claramente uma mudança de direcionamento, pois se antes o Esporte era o fim, agora ele se torna mais um dos meios de promoção da saúde. A partir da análise dos conteúdos previstos para as três séries do Ensino Médio, percebe-se a hegemonia da concepção da Educação Física enquanto formadora de hábitos saudáveis, isto é, de promoção da saúde.
Os conteúdos destinados à 1ª série do Ensino Médio dividem-se em cinco unidades: Qualidade de Vida; Esporte e Qualidade de Vida; Atividade Física como forma de prevenção de doenças; Lutas e qualidade de vida e Atividade Física e o uso de drogas. Neste primeiro ano, percebe-se que a qualidade de vida foi o mote da organização e da finalidade dos conteúdos.
No segundo ano do Ensino Médio, permanece a mesma divisão em unidades, com uma clara modificação nos conteúdos: Influência da Mídia; Esportes Radicais; Capacidades Físicas; Atividades de Academia e; Aptidão Física. Nesta série nota-se uma dispersão dos conteúdos, o primeiro aborda a influência da mídia sob um ponto de vista sociológico, destinando pouco espaço para a relação desta com a atividade física. A segunda unidade dirigida aos esportes radicais reflete a influência da mídia nos próprios idealizadores das propostas, visto que as escolas públicas em sua maioria não possuem espaços adequados para a prática destas atividades. Da terceira a quinta unidade há um retorno à percepção da Educação Física como promotora da saúde.
No tocante aos conteúdos previstos para o 3º ano do Ensino Médio, há uma consolidação da idéia de que a Educação Física deve preocupar-se com a manutenção da saúde e a prevenção de doenças. Permanecendo a mesma divisão por unidades, os conteúdos dividem-se em: Programa de Atividade Física; Atividades Físicas na 3ª idade; Valores Sociais da Atividade Física; Alimentação e Atividade Física; Lazer. Excetuando-se a terceira e a quinta unidades, as demais refletem o caráter médico preventivo dado à Educação Física.
Apesar deste “novo” direcionamento dado aos conteúdos da Educação Física para o Ensino Médio, no qual o esporte é secundarizado, não é isso que se evidencia na prática, pois a própria SEED organiza todos os anos os “Jogos da Primavera”, sendo que as disputas mais esperadas são aquelas que envolvem os estudantes do Ensino Médio. Neste ano, 2007, a SEED trouxe algumas novidades: a divisão da disputa em etapas e o campeão em cada modalidade sendo selecionado para representar o Estado de Sergipe nos Jogos Escolares Brasileiros (JEBs).
Desta forma, apesar do documento apontar um outro direcionamento, o que ocorre na prática é um completo entrelaçamento da Educação Física ao esporte. Outro dado que se apresenta é a participação das escolas particulares, que utilizam os resultados esportivos para fazer propaganda das instituições, inclusive concedendo bolsas de estudo a alunos de escolas públicas que se destacam nos jogos, com o intuito de reforçarem suas equipes esportivas. Com isto, os Jogos da Primavera, patrocinados pelo Governo do Estado, tornam-se um espaço de divulgação das escolas particulares. (continua)

domingo, 13 de junho de 2010

A EDUCAÇÃO FISICA NO ENSINO MÉDIO: PRÁTICA ESPORTIVIZANTE? (cONTINUAÇÃO III)

Com isto, sem ter uma finalidade clara, ou melhor dizendo, uma utilidade pragmática, a Educação Física continua sendo vista socialmente ou como o espaço do lazer, da brincadeira, ou da preparação esportiva. Esta percepção social leva a fatos inusitados, como o ocorrido durante a transmissão da final da competição de Basquetebol masculino dos Jogos Pan-americanos 2007, Brasil x Porto Rico, pela Rede Globo de Televisão, no dia 29 de julho, na qual os comentaristas, ex-atletas de Basquetebol, Oscar Schmit e Hortência, alardeavam: “Vocês que estão vendo este jogo e que querem aprender a jogar basquete, procurem seu professor de Educação Física e digam: - Eu quero aprender a jogar basquetebol!”.
Além deste, outros comentários se seguiram sobre a necessidade do aprendizado esportivo na escola, tendo como espaço as aulas de Educação Física. Esta mesma emissora televisiva, semanas antes dos Jogos Pan-americanos, havia exibido matérias em seu telejornal esportivo diário, Globo Esporte, demonstrando iniciativas de professores de Educação Física em prol do desenvolvimento esportivo e da formação de novos atletas.
O próprio Governo Federal, através do Ministério dos Esportes, desenvolveu um projeto chamado “Segundo Tempo”, no qual os alunos retornam à escola em um horário contrário ao de suas aulas, para serem iniciados em diversas modalidades esportivas.
Todas estas ações demonstram o quanto o esporte está presente no âmbito escolar. Nos PCNs de Educação Física está presente o seguinte comentário:

A influência do esporte no sistema escolar é de tal magnitude que temos não o esporte da escola, mas sim o esporte na escola. Isso indica a subordinação da Educação Física aos códigos/sentido da instituição esportiva: esporte olímpico, sistema desportivo nacional e internacional (BRASIL, 1999, p. 156).

Em Sergipe, o pós LDB 9394/96 fez fervilhar debates e escritos acerca dos destinos da Educação Física como componente curricular integrado à proposta pedagógica da escola. Várias iniciativas foram tomadas, o Departamento de Educação Física (DEF) da Universidade Federal de Sergipe (UFS) promoveu a I Semana de Educação Física, em 1999; antes disso, a Secretaria de Estado da Educação e do Desporto e Lazer de Sergipe (SEED), no ano de 1998, havia lançado um manual que deveria servir de base para os professores, os “Subsídios aos Conteúdos de Educação Física”. Neste manual é perceptível um duplo direcionamento: um voltado para a Educação Física enquanto promotora da saúde e outra dirigida para a formação desportiva dos alunos. É interessante ressaltar que tal documento destinava-se apenas ao Ensino Fundamental. (CONTINUA)

quinta-feira, 13 de maio de 2010

A EDUCAÇÃO FISICA NO ENSINO MÉDIO: PRÁTICA ESPORTIVIZANTE? (continuação II)

Desta forma, segundo o MEC, o processo de esportivização da Educação Física construiu modelos de aulas baseados na iniciação e no treinamento esportivo. No tocante ao Ensino Médio as aulas pautavam-se por:

a) ensino de gestos determinados pela performance de alguns atletas; b) fixação do gesto, assimilado pela repetição; c) aprimoramento técnico e tático; d) formação de equipes para competições. Ou seja, o objetivo era único: ser atleta em algum nível técnico possível em qualquer conteúdo da Educação Física (BRASIL, 2006, p. 231-232).

Ao estabelecer tais reflexões sobre a desportivização das aulas de Educação Física, nota-se a preocupação do MEC em dar um novo direcionamento às suas aulas, possibilitando a efetivação do preconizado pelos PCNs, os quais vislumbravam a reaproximação dos alunos às aulas de Educação Física de forma lúdica, educativa e que contribua para o processo de aprofundamento dos conhecimentos na área (BRANDL, 2003).
Isto não quer dizer que o esporte deva ser excluído das aulas de Educação Física, o que tem que haver é uma dosagem, isto é, um equilíbrio maior na utilização deste conteúdo. E, mais ainda, que o esporte deixe de ser a finalidade da Educação Física e passe a ser um dos meios de transmissão dos seus conhecimentos. Para a pesquisadora Carmem Elisa Henm Brandl (2003, p. 72)

O esporte deve ter seu espaço nas aulas de Educação Física, porém através de uma proposta que atinja todos os alunos e não somente os mais habilidosos. A aula não é espaço para treinamento de equipes, este espaço poderá ser garantido através de atividades extracurriculares, permitindo que os maiores interessados possam exercer atividades de sua preferência.

Esta pesquisadora defende, ainda, que os conteúdos a serem trabalhados pela Educação Física devam ser atinentes aos conhecimentos da Cultura Corporal, ou seja, que o aluno durante as aulas possa ter um conhecimento histórico, sociológico, antropológico, biológico..., que ele possa conhecer e experimentar o corpo em todas as suas dimensões.
Tal posição não diverge da adotada pelos PCNs, que buscam estabelecer uma integração da Educação Física com as demais disciplinas que compõem a estrutura escolar, sem, no entanto, desmerecer suas especificidades. Suraya Cristina Darido (2001, p. 15) ao refletir sobre os PCNs, fez a seguinte constatação:

Eleger a cidadania como eixo norteador significa entender que a Educação Física na escola é responsável pela formação de alunos que sejam capazes de: - participar de atividades corporais adotando atitudes de respeito mútuo, dignidade e solidariedade; - conhecer, valorizar, respeitar e desfrutar da pluralidade de manifestações da cultura corporal; - reconhecer-se como elemento integrante do ambiente, adotando hábitos saudáveis relacionando-os com os efeitos sobre a própria saúde e de melhoria da saúde coletiva; - conhecer a diversidade de padrões de saúde, beleza e desempenho que existem nos diferentes grupos sociais, compreendendo sua inserção dentro da cultura em que são produzidos, analisando criticamente os padrões divulgados pela mídia; - reivindicar, organizar e interferir no espaço de forma autônoma, bem como reivindicar locais adequados para promover atividades corporais de lazer.

Como se pode perceber, são muitas as competências e habilidades a serem desenvolvidas nas aulas de Educação Física, entretanto, após 11 anos de construção da LDB 9394/96, de mais de uma década de debates sobre diversas concepções de Educação Física e mais de meia década de constituição dos PCNs, ao que parece, o esporte continua sendo conteúdo hegemônico nas aulas deste componente curricular. No que diz respeito especificamente ao Ensino Médio, isto fica mais evidente, pois este grau do ensino se caracteriza também como uma “porta” de passagem para a Universidade e, diante desta realidade, a Educação Física, como uma forma de se legitimar neste ambiente “alheio aos seus conhecimentos”, utiliza-se do esporte para tentar atrair alunos. (continua)

domingo, 9 de maio de 2010

A EDUCAÇÃO FISICA NO ENSINO MÉDIO: PRÁTICA ESPORTIVIZANTE? (continuação)

Todas as concepções referidas anteriormente viam o esporte como um elemento da Educação Física e buscavam, algumas delas, alternativas para a sua utilização retirando desta prática o seu caráter excludente, seletivo. A concepção crítico-superadora, por exemplo, colocava o esporte no rol dos elementos a serem trabalhados pela Educação Física como um componente da Cultura Corporal. No entanto, nesta concepção o trato dado ao esporte ganharia uma nova dimensão, deixando de ser uma prática irrefletida, passando a discutir e questionar os componentes desta prática social, confrontando, sempre que possível, os conhecimentos do senso comum com os conhecimentos científicos. Em uma outra vertente, a concepção da Aptidão Física estabelecia uma crítica aos professores que pautavam sua prática no ensino das modalidades esportivas, pois tais atividades não teriam grande influência na promoção da saúde (GUEDES & GUEDES, 1996). Para NAHAS (1997) o direcionamento da Educação Física no Ensino Médio seria o de estabelecer uma relação entre a atividade física, a aptidão física e a saúde.
Para GUEDES & GUEDES (1993, p. 4):

Tradicionalmente os programas de educação física escolar tem procurado privilegiar as atividades voltadas a prática de esportes, seja de forma competitiva ou recreativa, com a falsa idéia de que a prática de esportes possa assegurar que as crianças e jovens, no futuro, se tornem pessoas adultas ativas fisicamente, e, portanto, mais saudáveis (...) Através desses programas, a nova função proposta aos professores de educação física, seria a de assumirem um novo papel frente a estrutura educacional, procurando adotar em suas aulas, não mais uma visão de exclusividade a prática desportiva, mas, fundamentalmente, alcançarem metas em termos de promoção da saúde, através da seleção, organização e desenvolvimento de experiências que possam propiciar aos educandos, não apenas situações que os tornem crianças e jovens mais ativos fisicamente, mas, sobretudo, que os conduzam a optarem por um estilo de vida ativo quando adultos.

Apesar de todo o discurso em prol da promoção da saúde, nas sugestões de conteúdos para os Ensinos Fundamental e Médio, os autores estabelecem a prática de competições esportivas, enfatizando que os objetivos deste conteúdo seriam a organização e administração de equipes e a realização de torneios esportivos, ou seja, ao que parece a inserção do esporte como conteúdo programático nesta concepção é feita sem que haja uma relação com os objetivos defendidos.
Além das diferentes concepções citadas anteriormente, após a publicação da LDB 9394/96, confeccionou-se um documento denominado de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), com o intuito de colaborar para a construção de propostas pedagógicas por parte das escolas e, ainda, contribuir para uma melhoria da prática docente. Os PCNs relativos à Educação Física também tentaram romper com a relação estabelecida entre esta disciplina e a prática esportiva. O Ministério da Educação (MEC) em suas “Orientações para o Ensino Médio” afirma:

... somos obrigados a reconhecer que, analisando o contexto e o cotidiano escolar, inclusive ouvindo os participantes dos seminários, a forma como os conteúdos são tratados nas escolas nas últimas décadas acabaram por torná-los formas esportivas/competitivas por excelência, deixando em segundo plano outros temas e perspectivas de formação próprios da Educação Física (BRASIL, 2006, p. 230).

O documento do MEC ainda desfere severas críticas ao processo discriminatório que este modelo de Educação Física produziu nas escolas, pois, ao enfatizar a prática esportiva, fazia-se uma seleção dos melhores, ou seja, é a consolidação da exclusão dentro do ambiente escolar. O texto faz ressalvas à utilização de discursos como: “Esporte é vida”, “Esporte é saúde”, “Esporte sim, drogas não”, pois eles servem como um anteparo para a massificação desta prática na escola via Educação Física. (continua)

sábado, 8 de maio de 2010

A EDUCAÇÃO FISICA NO ENSINO MÉDIO: PRÁTICA ESPORTIVIZANTE?

Pensar a Educação Física é, certamente, refletir sobre as formas sistematizadas de cuidado com o corpo, que tiveram como locus privilegiado o espaço escolar. Desde o século XIX direcionaram-se políticas com o objetivo de tornar o corpo mais saudável, foi o chamado movimento higienista. Somado a isto, estava a intenção de forjar uma raça “melhorada”, o que se denominou de eugenismo. Foi a escola um dos principais agentes propagadores destas ações, principalmente a partir do advento dos Grupos Escolares.
No início do século XX, os discursos higienistas e eugenistas ainda eram muito fortes e, alicerçada neste pensamento a ginástica (Educação Física) consolidou-se como um elemento importante na formação escolarizada. Durante toda a República Velha, a ginástica se fez presente no âmbito escolar através da aplicação de diferentes métodos: sueco, francês, alemão, dentre outros. Contudo, a partir da década de 30 do século passado, o esporte começou a estabelecer-se como um conteúdo da Educação Física. Foi nesta mesma época, de nacionalismo exacerbado, que o Presidente Getúlio Vargas “elevou”[1] a Capoeira ao posto de “ginástica nacional”.
A partir deste momento, o entrelaçamento entre a Educação Física e o Esporte vai se tornando cada vez mais forte. Apesar de entender que esta junção variou muito a depender da região e do estado, é comum encontrarem-se fotos de equipes esportivas em diferentes arquivos escolares espalhados pelo país.
Pode-se afirmar, entretanto, que a partir da segunda Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a 5692/71 e, principalmente, com o Decreto 69450/71, consolidou-se uma verdadeira simbiose entre a Educação Física e o Esporte. Com o referido Decreto, o projeto político-pedagógico para a Educação Física no Ensino Médio[2] enfatizava o Esporte de competição como conteúdo hegemônico da Educação Física. Desta forma, no Ensino Fundamental priorizou-se a recreação, os jogos pré-esportivos, a iniciação esportiva e, no Ensino Médio, a formação de equipes e o treinamento esportivo.
Esta política voltada para a Educação Física, principalmente no Ensino Médio, estava calcada no sucesso alcançado pelos Jogos Escolares Brasileiros (JEB’s) e os Jogos Universitários Brasileiros (JUB’s). A esportivização da Educação Física foi tão flagrante nesta época que a prática esportiva via Educação Física foi inserida no meio universitário através da obrigatoriedade da prática desta disciplina em todos os cursos de nível superior.
A partir da década de 70, com a massificação das coberturas esportivas e a ampliação do seu mercado em termos comerciais, esta prática social ganhou dimensões que ultrapassaram o de prática desinteressada, de lazer, abarcando contornos gigantescos, consolidando-se como uma instituição social.
A escola passou a ser vista como um “seleiro” de novos atletas, o local adequado para a formação de um “país olímpico”. Com isto, a Educação Física passou a ficar cada vez mais refém da prática esportiva. Profissionais e intelectuais preocupados com a dimensão que o esporte tomava no espaço escolar passaram a desferir severas críticas a este encaminhamento. Alguns asseveravam, utilizando-se do pensamento marxiano, que o esporte era o “novo ópio do povo”, pois ele levava a população ao estado de alienação.
No início da década de 90, vários foram os profissionais da Educação Física que escreveram sobre o assunto, a exemplo de Mauro Betti (1995) e Valter Bracht (1992). Este último dizia que a criança ao praticar esportes aprendia a respeitar as regras do jogo capitalista[3]. Ainda nesta década a aprovação da LDB 9394/96 e a inserção da Educação Física como um componente curricular integrado à proposta pedagógica da escola trouxeram novas perspectivas de atuação.
A década de 90 viu pulular, ainda, novas concepções para a Educação Física: crítico-superadora, a partir da escrita do livro Metodologia do Ensino da Educação Física (1992) tendo como elaboradores Valter Bracht, Micheli Ortega, Celi Tafarel, Carmem Lúcia Soares, Elizabeth Varjal e Lino Castelani Filho; a desenvolvimentista, tendo por principal articulador Go Tani; a crítico-emancipatória de Elenor Khunz; a de aulas abertas de Heiner Hildebrandt; a da aptidão física com Dartagnan Pinto Guedes, dentre outras.
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[1] Digo elevou, pois a Capoeira até então era uma prática marginalizada, inclusive considerada a sua prática contravenção pela legislação vigente.
[2] Utilizarei aqui as nomenclaturas dadas pela LDB 9394/96, ou seja, ao invés de Ensino de 1º e 2º Graus, respectivamente, Ensino Fundamental e Médio.
[3] Esta posição foi revista pelo autor em artigos e trabalhos posteriores.

domingo, 25 de abril de 2010

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se perceber que apesar de algumas semelhanças no que concerne aos regulamentos dos Aprendizados e dos Patronatos e, também, de ambas as instituições enfocarem o ensino primário profissional agrícola, havia uma grande distinção no funcionamento das mesmas.
O primeiro elemento que as distingue é a sua clientela, enquanto os Aprendizados voltavam-se para os filhos de trabalhadores agrícolas e pequenos proprietários de terra, os Patronatos destinavam-se a menores abandonados, ou com desajustamento social, respondendo assim a um duplo objetivo: o de capacitação profissional e o de regenerador social.
Outro fator que as distancia é que os Patronatos tiveram muito mais clientela que os Aprendizados, no entanto não transformaram o maior número de alunos em produção para o estabelecimento. Ou seja, de certa forma os Aprendizados tinham um funcionamento mais otimizado que os Patronatos tendo em vista o aspecto produtivo.
Contudo, é perceptível que naquele momento havia um maior interesse da sociedade em instituições que se pautasse por um caráter corretivo, talvez isto explique o crescimento no número de Patronatos em detrimento ao número de Aprendizados.
Apesar disto foram os Aprendizados que no ano de 1934, quando da reforma do ensino agronômico foram privilegiados, o que demonstra um redirecionamento na percepção e no interesse dos administradores públicos por este tipo de instituição. Desta forma, até o ano de 1934 os Aprendizados sofreram com a baixa matrícula de alunos, o que fazia os administradores investirem pouco nestas instituições, a exceção do Aprendizado de Barbacena que servia como uma espécie de “campo de experimentação” dos egressos da Escola Superior de Agricultura e Medicina Veterinária. Já os Patronatos ao longo dos dezesseis anos[i] de funcionamento da rede, a discussão entre a regeneração e a formação profissional foi o foco dos embates e, ao que parece, a função regenerativa foi a que se sobressaiu, inclusive, sendo uma das causas da falência do modelo.
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[i] Trabalho com a escala temporal de dezesseis anos, pois a criação do primeiro Patronato Agrícola deu-se no ano de 1918, e no ano de 1934 essas instituições passaram por profundas transformações, criando-se em lugar delas os Aprendizados Agrícolas.


REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO E FONTES


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BRASIL. Decreto n° 8319 de 20 de outubro de 1910.
BRASIL. Relatório do Ministro da Agricultura Indústria e Comércio enviado ao Presidente da República. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 1910-1911.
BRASIL. Relatório do Ministro da Agricultura Indústria e Comércio enviado ao Presidente da República. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 1911-1912.
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BRASIL. Relatório do Ministro da Agricultura Indústria e Comércio enviado ao Presidente da República. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 1920.
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BRASIL. Relatório do Ministro da Agricultura Indústria e Comércio enviado ao Presidente da República. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 1923.
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